Conforme o PIRANOT vinha afirmando desde agosto do ano passado, Gabriel Ferrato deixou o PSDB depois de quatro décadas. Em carta, o atual prefeito de Piracicaba faz duras críticas ao partido e ao ex-amigo Barjas Negri, futuro candidato do partido para as eleições deste ano.
Em tom de desabafo, Ferrato conta como sentiu que não fazia mais parte do partido. “Em 2015, quando me manifestei publicamente de que estava sendo expulso do PSDB, tive razões de sobra para fazê-lo. No mesmo ano, em reunião do partido, fui claro ao dizer que esse já não era o partido que ajudei a fundar, um partido que, pelos movimentos que eu observava, passara a ter dono. Foi o meu primeiro alerta. Fizeram ouvidos moucos e ouviu-se um silêncio ensurdecedor desde então. Nenhuma discussão. Nenhum debate. Não entenderam a gravidade de minhas palavras. Elas foram levadas pelo vento. Ou, então, outros interesses já estavam em jogo.”, disse o prefeito no primeiro paragrafo de 12.
Em outro trecho, Ferrato fala sobre a movimentação do ex-prefeito e futuro candidato a ocupar o seu cargo. “O pior é que alguns de seus integrantes sabiam da movimentação do ex-prefeito Barjas Negri pelo menos desde o início de 2015, e alguns, inclusive, participavam das articulações e promoviam reuniões para trazê-lo de volta ao centro das atenções e para promovê-lo novamente como candidato a prefeito pelo partido. Aliás, esse movimento do ex-prefeito vem desde 2014, segundo ano de meu mandato, quando ele já se preparava e já articulava a sua volta (que fique claro: eu nunca tive nenhum acordo com o ex-prefeito para que ele voltasse após meus quatro anos de mandato, como ele, oportunisticamente, fez pensarem). Quando o plano já estava organizado e em andamento, informou-me que pretendia ser candidato, no início de 2015.”
Continuando o desabafo, o prefeito faz questionamentos. “Baseado em quê? Que somente ele poderia ganhar a eleição em Piracicaba, pois somente ele teria o poder de articulação política e de juntar pessoas para essa finalidade. Dois anos antes do processo eleitoral! Segundo o próprio ex-prefeito, meu governo era bom, mas muito técnico e não sabia fazer política. Ora, mas se era um bom governo por que, no momento certo, não conseguiria o apoio da sociedade para buscar a reeleição? Bastaria eu fazer mais política (qual política, a dele?) e os militantes do partido irem às ruas, como sempre fizeram, mostrando nossas realizações em favor da população.”
Para Ferrato, Barjas Negri teria agido para puxar o seu tapete, como afirmou em entrevista à uma rádio local sua esposa. “O argumento do ex-prefeito é frágil. Ele sabe que é a partir do terceiro ano do mandato que o novo prefeito pode ser reconhecido ou não pelo seu trabalho. Seria quando o processo político poderia iniciar mais fortemente. O que fez ele? Procurou, incessante e obstinadamente, interromper esse processo. Passou a ficar de sexta a segunda-feira na cidade, além da presença em algumas noites, fazendo as suas articulações políticas. Para ele. Por que não para mim, como fiz e fizemos para ele em todos esses anos? Se a questão era política, por que não concentrar os esforços dele e do partido para mudar o quadro? Pois bem, enquanto eu trabalhava pela cidade, ele fazia política. Foi assim ao longo de todo 2015 e, mais ainda, agora em 2016. Sei de cada passo que deu para minar as possibilidades de uma eventual candidatura minha. Começou apresentando, a alguns grupos influentes da cidade, uma pesquisa que elaborou para mostrar que somente ele poderia ganhar a próxima eleição. Curiosamente, não mostrou os resultados de outra pesquisa, no mesmo período, na qual eu empatava tecnicamente com ele no voto espontâneo. Isso no final de 2014, quando eu tinha somente dois anos de mandato contra uma memória de oito anos dele!”
Ainda sobre a pesquisa, Ferrato fala de ética. “A pesquisa mostrava, portanto, que essa memória de oito anos já começava a enfraquecer, o que é comum nas mudanças de poder. Isso acontecia mesmo com o esforço do ex-prefeito para que se mantivesse na memória viva da população por meio de seus artigos semanais em um jornal local. Em atitude no mínimo deselegante e antiética com o atual chefe do Executivo, nesses artigos, com nada discretos autoelogios, procurava e procura convencer as pessoas de que sua administração constituiu um “nunca antes nesta cidade”, à semelhança do bordão do ex-presidente Lula, que também se julga o único e insuperável, mas que, pelo menos até a reeleição da atual presidente da República, teve uma atitude mais ética com sua sucessora. A propósito, os artigos do ex-prefeito são repetitivos, pois o mesmo assunto é tratado em vários artigos, com outras palavras e abordagens, pelo seu “ghost writer”. Não bastasse isso, o ex-prefeito começou a se utilizar de outras armas para seus propósitos. Conheço-as todas, desde o seu início. Tenho conhecimento de todos os demais passos que deu no sentido de tentar eliminar minhas possibilidades de reeleição, tanto dentro como fora do partido. Todos os métodos que utilizou e utiliza para me desestabilizar também. Alguns são ridículos, mas deixo de torná-los públicos, pois o ridículo poderia ser ridicularizado.”
O prefeito fala na carta também sobre o seu governo. “Estou administrando a cidade em um contexto completamente diferente do vivido pelo ex-prefeito. No seu período havia recursos em abundância devido ao crescimento econômico do país e aumento substancial da arrecadação municipal. Era fácil fazer política. No meu, já perdemos, em quatro anos, cerca de R$ 130 milhões que não foram e não serão arrecadados. Somente neste ano de 2016 deixaremos de arrecadar mais de R$ 55 milhões, valor muito superior ao orçamento da Guarda Civil Municipal, de R$ 35 milhões, com 424 integrantes, que trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana. Tivemos que cortar vários projetos e ampliar a austeridade. Nem por isso deixamos de promover melhorias na cidade e nas políticas públicas. Avançamos nas políticas públicas em todas as áreas, mas com especial ênfase na saúde pública e na educação, além dos investimentos na mobilidade urbana – necessários para uma cidade que se expande aceleradamente – como ficará ainda mais visível a partir deste ano com o início da implantação dos corredores de ônibus e da modernização dos terminais.”
Ferrato fala ainda sobre convites que teria recebido de outros partidos. “Os constrangimentos pelos quais estava passando, que tornei públicos, foram a razão para passar a receber convites de outros partidos e outras propostas de continuidade na vida pública. Não procurei ou me apresentei para outros partidos; fui convidado. Não traí o meu partido; fui traído. Como disse no início e tive oportunidade de declarar em reuniões da agremiação, o PSDB de Piracicaba não é mais o partido que ajudei a fundar, do qual fui militante desde o seu início e por meio do qual exerci diversas funções públicas com muita honra, fidelidade, lealdade e compromisso. Transformou-se em um partido com dono, que talvez possa vir a ser chamado de P do B. Partido com dono deixa de ser democrático e passa a ser autoritário, a fazer as vontades do príncipe.”
O prefeito em um penúltimo parágrafo volta a criticar fortemente Barjas Negri. “Finalmente, em minha última participação em reunião partidária de fevereiro deste ano, disse claramente que não participaria de prévias, pois o jogo já estava jogado. Mesmo com essa minha decisão, o ex-prefeito defendeu as prévias. Elas são uma farsa. As alegações do ex-prefeito de que é uma decisão do partido, do Diretório Estadual, também são uma farsa. As prévias foram criadas para os casos em que o partido não está no poder e existe mais de um interessado em ser candidato para disputar o poder. Não é o caso de Piracicaba, pois o partido está no poder. Outra farsa do discurso do ex-prefeito, claramente demagógica, é de que nas prévias qualquer militante pode ser candidato e ele respeitaria os resultados, apoiando quem ganhasse as prévias. Pergunto: existe algum integrante do partido que vai disputar contra o seu dono? Um verdadeiro desrespeito à inteligência dos militantes. E tem gente que aplaude…”
Ferrato encerra falando sobre seu futuro. “Estou definindo os meus caminhos. Tenham a certeza de que não vou abandonar a luta por uma sociedade mais ética, justa, fraterna e solidária. Neste campo, estaremos juntos. Não estou abandonando as pessoas e a militância do partido, com quem tenho afinidades pessoais e políticas. Estou abandonando uma situação. Tenham a certeza – os verdadeiros militantes e não os oportunistas de época eleitoral – de que continuarei carregando o carinho de vocês e agradecendo o apoio e permanente colaboração. Não me esquecerei de nenhum dos momentos de luta, angústia e vibração que compartilhamos em todos esses anos. Mas não se esqueçam de que este pode ser um ano de muitas promessas. Não se deixem enganar. Não se deixem trair.”