O que para muitos parece “um bug” é, na verdade, um protocolo técnico de emergência, baseado em um mecanismo de sequestro momentâneo e coletivo da rede. A tecnologia, conhecida como Cell Broadcast, permite que governos emitam mensagens diretas, sem depender de aplicativos, internet ou autorização do usuário. Quando o alerta é classificado como “severo” ou “extremo”, o sistema assume temporariamente prioridade sobre as demais funções do aparelho — travando tela, silenciando transmissões e reproduzindo o som característico de alarme público.
Um sistema que “toma controle” por segundos
Segundo especialistas em comunicação de risco, o processo é semelhante a uma “invasão controlada”, autorizada por normas internacionais e acordos entre governos e operadoras. “É um sequestro momentâneo de rede. O celular é temporariamente tomado pelo sistema de alerta público, que tem prioridade total sobre qualquer outro tipo de sinal”, explica André Martins, engenheiro de telecomunicações ouvido pelo PIRANOT.
A emissão do alerta é feita a partir do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), em Brasília, e replicada por antenas de telefonia em todo o território atingido. O objetivo é garantir que mensagens críticas cheguem instantaneamente, mesmo sem internet, e que nenhum cidadão dentro da área de risco fique sem aviso.
Do “falso tsunami” aos alertas reais
O sistema, no entanto, ainda enfrenta desafios. Há oito meses, um falso alerta de “terremoto e tsunami” disparado apenas em celulares Android causou pânico durante a madrugada em várias cidades. O governo classificou o caso como “falha técnica”, mas especialistas dizem que episódios assim abalam a confiança pública e demonstram a necessidade de maior transparência sobre quem dispara os avisos e sob quais critérios.
Quando o aviso vira “EMERGÊNCIA COLETIVA”
De acordo com o protocolo internacional do sistema de alertas, um aviso de “emergência coletiva” pode ser emitido em casos de ameaça à vida humana, como desastres naturais, rompimentos de barragens, ataques terroristas ou emergências de saúde pública. No Brasil, as categorias vão de “atenção” até “extremo” — sendo este o único nível em que o sistema “sequestra” o celular por completo.
“Quando o alerta chega, o celular literalmente para. Isso é projetado para forçar a leitura da mensagem. O objetivo é salvar vidas, mas a forma como isso acontece pode assustar quem não está preparado”, acrescenta o especialista.
Entre segurança e privacidade
A discussão sobre a privacidade do usuário e o poder de alcance desses sistemas volta a ganhar força. Embora as operadoras garantam que os alertas não permitem rastreamento ou coleta de dados, o modelo cria um precedente inédito: o Estado pode, legalmente, interromper o funcionamento de milhões de aparelhos simultaneamente.
Para a população, o desafio é equilibrar o desconforto do “alarme forçado” com o benefício de ser avisado a tempo em casos de desastre. O consenso entre especialistas é que, quanto mais a sociedade compreender o funcionamento do sistema, menor será o impacto emocional quando o próximo alerta soar.



