Quatro das mais influentes associações que representam bancos, financeiras e fintechs no Brasil emitiram, neste sábado (27), um comunicado conjunto em defesa vigorosa da atuação do Banco Central (BC) diante da controvertida liquidação do Banco Master. O documento, divulgado em um momento de crescentes questionamentos sobre as decisões adotadas no processo, clama pela salvaguarda da autoridade técnica e da independência institucional do regulador. Essa manifestação sublinha a importância de um órgão supervisor com autonomia para garantir a robustez e a resiliência do sistema financeiro nacional, elementos cruciais para a confiança de investidores e a estabilidade econômica. As entidades buscam reforçar a legitimidade das decisões prudenciais do BC, alertando para os riscos inerentes à interferência externa em matérias estritamente técnicas e à segurança jurídica do mercado.
A Defesa da Autonomia Regulatória e os Riscos de Intervenção
Fundamentação da Posição das Entidades e o Alerta de Instabilidade
As associações signatárias – a Associação Brasileira de Bancos (ABBC), a Associação Nacional das Instituições de Crédito (Acrefi), a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Zetta, que congrega empresas do setor financeiro e de meios de pagamento – sustentam que a presença de um regulador técnico e verdadeiramente independente é um dos pilares inabaláveis para a manutenção de um sistema financeiro sólido e resiliente. Conforme o posicionamento divulgado, o Banco Central tem desempenhado esse papel com uma “supervisão bancária atenta e independente”, pautada exclusivamente por critérios técnicos, prudência e vigilância. Este método, argumentam os representantes das instituições financeiras, é essencial não apenas para prevenir crises, mas também para proteger o sistema financeiro brasileiro de abalos inesperados, assegurando a estabilidade e a integridade de suas operações diárias.
Em sua nota conjunta, as entidades do setor financeiro expressam uma profunda preocupação com a possibilidade de revisão das decisões técnicas do regulador por outros órgãos do Estado. Alertam categoricamente que tal cenário poderia precipitar o Brasil em um “terreno sensível de instabilidade regulatória e operacional”. A materialização dessa hipótese resultaria em severa insegurança jurídica, comprometendo a previsibilidade das decisões e, por consequência, a confiança no sistema financeiro como um todo. Juntas, as quatro associações representam uma parcela significativa do setor – mais de 100 instituições financeiras, abrangendo cerca de 90% do setor e 98% dos ativos totais do sistema –, conferindo peso substancial ao seu apelo por respeito irrestrito à autonomia e à expertise técnica do Banco Central.
O Papel Preventivo do Banco Central e o Contexto do Caso Master
A Supervisão Prudencial e os Desafios Atuais em Meio a Questionamentos
As associações enfatizam o caráter eminentemente preventivo da supervisão exercida pelo Banco Central. Essa atuação proativa assegura que bancos e outras instituições financeiras mantenham níveis adequados e rigorosos de capital e liquidez, além de implementarem políticas de risco compatíveis com seus respectivos modelos de negócio e com as melhores práticas internacionais. Um indicador da eficácia e da resiliência dessa abordagem é o baixo número de instituições com problemas de solvência registrados no Brasil nos últimos anos, mesmo em períodos de grande turbulência econômica global, como a crise financeira de 2008 e a recente e prolongada pandemia de COVID-19. Este histórico, defendem as entidades, valida de forma contundente a competência e a robustez da estrutura regulatória brasileira, fundamentada na expertise técnica do BC.
Embora reconheçam o papel fundamental e constitucional do Poder Judiciário na análise dos aspectos jurídico-legais da atuação do Banco Central, as entidades defendem veementemente a preservação do mérito técnico intrínseco às decisões prudenciais do regulador. O enfraquecimento da autoridade e da credibilidade do regulador, argumentam, poderia gerar impactos negativos sistêmicos para a economia, aumentando os riscos não apenas para depositantes e investidores, especialmente os de pequeno e médio porte, mas também para a estabilidade macroeconômica. Em apoio a essa perspectiva, a Anbima, associação que representa os mercados financeiro e de capitais, também manifestou seu endosso à autonomia do BC, ressaltando que decisões de liquidação são estritamente técnicas, baseadas em critérios prudenciais sólidos, e que uma eventual reversão delas comprometeria os pilares fundamentais de confiança e previsibilidade do sistema financeiro.
Este cenário de defesa veemente da autonomia regulatória ocorre simultaneamente a desenvolvimentos importantes no inquérito que apura irregularidades envolvendo o Banco Master. No mesmo dia da divulgação das manifestações das entidades financeiras, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve a realização de uma acareação crucial no âmbito da investigação. Agendada para a próxima terça-feira (30), a audiência deve reunir figuras-chave no processo: o diretor de Fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino Santos; o controlador do Banco Master, Daniel Vorcaro; e o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB), Paulo Henrique Costa. O objetivo explícito da acareação é confrontar versões sobre a atuação do BC e elucidar indícios de fraude relacionados à tentativa de venda do Master ao BRB, aspectos centrais para a compreensão do caso. O processo, que corre sob sigilo no STF após ser avocado por Toffoli, intensifica o debate sobre a supervisão bancária e as decisões regulatórias no país, adicionando uma camada de complexidade jurídica ao cenário.
Reflexões sobre a Governança e o Futuro da Estabilidade Financeira
A conjuntura atual, marcada por questionamentos judiciais e a forte manifestação pública do setor financeiro, sublinha a relevância crítica da independência do Banco Central como pilar central da governança econômica do Brasil. A defesa intransigente da autoridade técnica e da autonomia do regulador é vista como uma salvaguarda essencial contra intervenções externas que poderiam erodir a previsibilidade e a confiança indispensáveis para o bom funcionamento dos mercados. O debate em torno do caso Master, portanto, transcende a especificidade de uma única instituição, tornando-se um catalisador para a discussão mais ampla sobre os limites da intervenção judicial em decisões estritamente técnicas e prudenciais. A estabilidade do sistema financeiro, a proteção efetiva dos poupadores e investidores, e a capacidade do país de atrair e reter capitais dependem diretamente da percepção de que as instituições reguladoras operam com autonomia plena e baseadas em critérios objetivos e técnicos. Preservar essa independência não é apenas uma questão de formalidade institucional ou de prestígio, mas uma necessidade estratégica fundamental para a solidez econômica e a credibilidade internacional do Brasil, garantindo que o sistema financeiro continue a ser um motor robusto de desenvolvimento e crescimento, e não uma fonte de incertezas e instabilidade para o futuro.






