O caso de agressão entre duas mulheres em uma lotérica de São Pedro, na região metropolitana de Piracicaba, gerou grande repercussão nas redes sociais e levantou um debate jurídico sobre o uso das filas prioritárias no Brasil.
A confusão começou quando uma jovem loira entrou na fila de atendimento preferencial e foi questionada por outros clientes sobre o motivo de estar ali. Ela alegou que tinha um filho autista, o que lhe garantiria o direito à prioridade. No entanto, algumas pessoas que estavam no local argumentaram que ela não estava com a criança naquele momento, o que gerou revolta e resultou em uma briga, que terminou na delegacia.
A discussão gerou dúvidas: uma mãe ou responsável por uma pessoa com deficiência precisa estar acompanhada dela para utilizar a fila prioritária? O que diz a legislação brasileira sobre isso?
📜 O que diz a lei sobre as filas preferenciais?
O direito ao atendimento prioritário está previsto em diferentes legislações no Brasil, incluindo a Lei da Acessibilidade (Lei 10.048/2000), o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) e o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990).
Essas leis garantem atendimento preferencial a pessoas com deficiência, idosos, gestantes, lactantes, pessoas com crianças de colo e indivíduos com mobilidade reduzida. No caso de crianças autistas, a prioridade também é assegurada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência e pela Lei 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
A Lei 10.048/2000, no artigo 1º, estabelece que:
“As pessoas com deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 anos, as gestantes, as lactantes, as pessoas com crianças de colo e os obesos terão atendimento prioritário.”
Já o Estatuto da Pessoa com Deficiência, no artigo 9º, reforça que o atendimento prioritário deve ser concedido em todos os serviços públicos e privados de atendimento ao público, sem necessidade de solicitação prévia.
Mas a mãe ou responsável precisa estar acompanhada da pessoa com deficiência para usufruir desse direito?
📌 Responsáveis legais podem utilizar a fila prioritária sem a presença do beneficiado?
A legislação não especifica de forma clara se o responsável por uma pessoa com deficiência pode utilizar a fila prioritária sem estar acompanhado dela. No entanto, algumas interpretações jurídicas e decisões judiciais já reconheceram que, em determinadas situações, o responsável pode sim utilizar a fila sem a presença do beneficiado, principalmente se o atendimento for em benefício direto da pessoa com deficiência.
No caso da briga na lotérica de São Pedro, a mãe alegou que precisava realizar um serviço rapidamente e voltar para casa, onde seu filho autista estava sob os cuidados do avô. Se a ação que ela realizaria na lotérica tivesse relação direta com as necessidades da criança — como pagamento de contas essenciais para a família ou saque de benefícios sociais —, há argumentos favoráveis de que ela poderia, sim, utilizar a fila prioritária.
Por outro lado, alguns juristas defendem que o atendimento preferencial deveria ser concedido apenas quando a pessoa com deficiência está presente, para evitar abusos e garantir que o benefício seja concedido de forma justa.
🔍 O que dizem especialistas?
A falta de clareza na legislação sobre esse ponto abre margem para diferentes interpretações. Advogados e especialistas em direito do consumidor apontam que não há proibição expressa sobre o uso da fila prioritária pelo responsável legal sem a presença da criança.
O advogado Marcelo Nascimento, especialista em direito do consumidor, explica:
🗣️ “A lei garante prioridade para pessoas com deficiência e, consequentemente, para quem age em benefício delas. Se a mãe estava realizando um serviço essencial para o filho, o princípio da razoabilidade poderia ser aplicado para justificar o uso da fila prioritária.”
Já a jurista Carla Mendes, especializada em acessibilidade e inclusão, destaca:
🗣️ “O direito à prioridade deve ser analisado caso a caso. Se a mãe usou a fila para um atendimento que beneficiaria diretamente o filho, há fundamentos para conceder a preferência. No entanto, se o serviço não estava relacionado à criança, o uso da fila poderia ser contestado.”
👨⚖️ O que pode ser feito para evitar conflitos?
Diante da falta de clareza da lei, algumas medidas poderiam evitar discussões e garantir um atendimento mais justo para todos:
✔️ Estabelecimentos poderiam esclarecer regras – Colocar cartazes informando se o atendimento preferencial se estende a responsáveis sem a presença do beneficiado.
✔️ Capacitação de funcionários – Treinar atendentes para lidar com essas situações de forma humanizada e evitar constrangimentos.
✔️ Documentação comprobatória – Algumas empresas já exigem documentos ou cartões de identificação para garantir que o direito está sendo corretamente utilizado.
✔️ Atualização da legislação – Esclarecer, por meio de leis complementares ou decretos, se o responsável pode ou não utilizar a fila sem a presença da pessoa com deficiência.
📢 Conclusão
O caso da confusão na lotérica de São Pedro mostra como a falta de clareza na legislação sobre atendimento prioritário pode gerar conflitos. Embora a lei garanta esse direito às pessoas com deficiência e seus responsáveis, não há um consenso sobre se o responsável pode utilizá-lo sem estar acompanhado do beneficiado.
A melhor solução, nesses casos, seria o bom senso e a empatia de todas as partes envolvidas. O direito à prioridade existe para facilitar a vida de quem realmente precisa, e o respeito entre os cidadãos deve ser sempre a principal regra.
A polêmica continua nas redes sociais, e o caso pode abrir um debate importante sobre a necessidade de regulamentação mais clara sobre o uso das filas preferenciais no Brasil.